“Sabe, recentemente tive uma idéia pra um novo game show. Se chama O Velho Jogo. Você tem três caras velhos com pistolas carregadas no palco. Eles olham para suas vidas, vêem o que eram, o que conquistaram, quão perto eles chegaram de alcançarem seus sonhos. O vencedor é aquele que não colocar uma bala na cabeça. Ele ganha uma geladeira.”
Desde criança comecei a pensar nessas fitas. “Quando ficar velho e olhar pra trás, o que vou ver?” Depois, cristão, a pergunta ficou mais pertinente. “O que vou apresentar pra Deus naquele dia?”
Alívios religiosos
Kardecistas e adeptos de algumas outras religiões tentam amenizar a primeira pergunta dizendo que temos muitas encarnações. Assim, não fica tããão ruim se fizermos várias besteiras numa vida, pois sempre teremos outra chance. Isso nunca me convenceu.
Muitos protestantes tentam aliviar a segunda pergunta com um conceito fariseu de graça. Pra eles não importa muito o que fazemos nessa terra, contanto que pertençamos à crença certa, podemos ficar tranquilos em relação ao dia do juízo. Isso me convenceu até eu ler a Bíblia.
Desculpas pra pipoca
O fato é que olhando pras pessoas, realmente são poucas aquelas que podem olhar pra trás e dizer: realizei meus sonhos de juventude. A maioria das pessoas olham pra trás e tentam se convencer do por quê foi melhor ter acabado assim.
Eu não sou tão velho (27 anos) e já vejo que grande parte dos meus colegas deixaram seus sonhos de juventude. Pensando nos cristãos, foram quase todos. Tinha muitos amigos que desejavam dedicar suas vidas ao Evangelho. Sonhavam em ser pastores, profetas, missionários, ter bandas evangelistas, etc. A esmagadora maioria acabou se conformando com aquilo o que o destino trouxe. Depois arrumaram uma justificativa pra explicarem porque foi melhor assim.
Os que se desculpam normalmente dizem pra si mesmos que eram irrealistas. Acho que aí mora parte da verdade. Não que sonhamos coisas irreais quando somos jovens, mas não calculamos realisticamente o preço que teremos que pagar para alcançá-las. Romantizamos a caminhada e, quando o desafio vem, ele nos surpreende e pipocamos. Daí, depois de um tombo, muitos optam por arrumar uma desculpa pra ficar no chão ao invés de se levantar e tentar de novo.
Marcos da derrota
Mas o desvio do propósito inicial não se dá do dia pra noite. A pipocada pode ter momentos marcantes. Fazer uma viagem ou faculdade, aceitar um emprego ou um pedido de casamento. Porém, o comprometimendo é gradual. Num primeiro momento a pessoa diz pra si mesma: “Vou fazer isso, mas nada vai mudar”. Mentira. Aos poucos ela vai cedendo aqui e ali. Quando vê já está tendo que arrumar explicações pra se convencer de seus atos.
Aliás, esse é um bom sinal pra você identificar que cedeu. Quando você está tendo que dar muita explicação daquilo que está fazendo, algo não está na linha. Se você tá caminhando o estreito, justificativas nem lhe cruzam a mente. Na cabeça só tem espaço para aquela satisfação que só tem quem carrega a convicção de estar buscando o excelente.
O inevitável dia de olhar pra trás
Sempre tive medo (temor) de levar uma vida onde eu tenha que pensar nessas desculpas pra conviver com minha consciência. O Velho Jogo vai rolar um dia e vai ser mais punk do que a descrição do cara. Estaremos diante do Trono Divino, teremos que olhar pra nossas vidas e falar daquilo que fizemos e daquilo que não fizemos porque nos acovardamos. Naquele dia, será que você vai querer ter uma pistola carregada?
[1] Confessions Of A Dangerous Mind
EUA/Canadá/Alemanha, 2002
Direção: George Clooney
Roteiro: Charlie Kaufman
Elenco: Sam Rockwell, Drew Barrymore, Julia Roberts, George Clooney, Rutger Hauer
Duração: 113 min.
Site: http://www.imdb.com/title/tt0290538/
Texto: Tonholas
Fonte: UG www.underground.org.br
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